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A inconstitucional lei do rol exemplificativo, o oportunismo legislativo e o aumento da judicialização

  • Foto do escritor: Bruno Marcelos
    Bruno Marcelos
  • 6 de mai.
  • 4 min de leitura

Atualizado: 8 de mai.

O STF retomou o julgamento da ADI 7265 que cuida da avaliação sobre a inconstitucionalidade da Lei 14.454/22. A indicada Lei foi objeto de tramitação acelerada no Senado Federal e surgiu como resposta ao julgamento na 2ª Seção do STJ do EREsp 188929, que consolidou o rol como taxativo, porém, admitindo algumas exceções.

 

Já tivemos a oportunidade de expor os eventos ocorridos naquele período, desde o julgamento do EREsp 188929 a promulgação da Lei[1], analisando o movimento dos grupos de interesse na alteração do status quo e identificando a presença de interessados que até então permaneciam ocultos. A retomada do julgamento confirma os desdobramentos apontados no trabalho acadêmico, reforçando a relevância do tema.

 

Sobre a Lei esta é francamente inconstitucional, se considerarmos que existe precedente do STF relativo à dinâmica da regulação. Para a compreensão adequada da tese que aponta a inconstitucionalidade, é necessário compreender o contexto da criação da norma, tal como apresentada no trabalho acadêmico.

 

Em 08/6/2022 a 2ª seção do STJ, após forte divergência entre turmas e envolto a um conturbado julgamento, decide por meio do julgamento pela 2ª Seção e considerando os EREsp 1886929 e EREsp 1889704 que o rol seria taxativo cabendo algumas exceções. Tal movimento provoca a reação imediata de grupos de interesses ligados a sociedade civil que mobilizam o congresso nacional, e em 13/7/2022, portanto, pouco mais de 30 dias depois já tramitava no PL 2033/2022, que foi objeto de tramitação prioritária tendo como principal motivação o julgamento do STJ[2]. O texto foi aprovado na câmara em 03/8/2022 e encaminhado ao Senado em 09/8/2022, e após rápida tramitação foi promulgada em 21/9/2022.

Fica patente que a Lei foi criada em resposta a um julgamento do STJ, portanto, para alterar o entendimento do STJ sobre uma norma regulatória.

 

Feitas estas considerações, o STF ao julgar o ADI 5.501 enfrentou questão semelhante do ponto de vista da dinâmica da regulação. Se tratou do julgamento sobre a inconstitucionalidade da Lei 13.269/16 que determinava que o SUS disponibilizasse fosfoetalonamina a pacientes com câncer terminal. O indicado elemento químico já havia sido objeto de recusa quanto ao registro como remédio pela ANVISA por ausência de critérios técnicos que indicassem sua eficácia e segurança.

 

A mencionada Lei 13.269/16 surge em resposta a notória existência de milhares de ações judiciais e ao clamor popular que impregnou o Congresso Nacional pela busca de uma suposta cura para o câncer, o que motivou políticos a editarem em tempo recorde a mencionada Lei.

 

No julgamento paradigmático para a dinâmica da regulação, considerando que este aponta para os limites da substituição regulatória das normas da agência por Leis do Congresso Nacional, o STF declarou a inconstitucionalidade da lei oportunista e fixou pontos relevantes, dentre os quais destacamos[3].


1)     O exercício de direitos fundamentais não é absoluto;

2)     A regulação técnica efetivada por órgão quem foi normativamente atribuída não pode ser suprimida nem mesmo pelo Poder Legislativo.

3)     Violação a separação dos Poderes, porque a Lei corrompeu a descentralização técnica necessária a fiscalização de atividades sensíveis (reserva da regulação/administração).

 

Registre-se sobre o tema o voto do Min. Luiz Roberto Barroso, atual relator do ADI 7265, sobre a reserva da regulação:

 

Em segundo lugar, configura-se violação à reserva de administração, que dcorre do princípio da separação dos poderes (CF/1988, Arts. 2º e 60, §4º inc. III). Ao autorizar o uso da fostoetalonamina sintética sem registro sanitário, o Poder Legislativo substituiu o juízo essencialmente técnico da ANVISA por um juízo político, interferindo de forma indevida em procedimento de natureza tipicamente administrativa.

 

Transportando os elementos jurídicos do indicado julgado, estamos diante da mesma situação. E isto porque, a Lei 14.454/22 também é uma Lei oportunista, criada para substituir a regulação técnica produzida pela ANS para avaliação da lista de procedimentos cobertos pelos contratos de planos de saúde (rol ANS), desconsiderando que a Lei fixa a competência da Agência para o rol (Art. 4º, inc. III da Lei 9.961/00) esta que o faz por meio da RN ANS 555/22.

 

O Congresso Nacional ao alterar a Lei 9.656/98 o faz unicamente para alterar o resultado de um julgamento, e ainda, para modificar a escolha técnica regulatória produzida pela ANS, sobrepondo-se de forma ilegal sobre os demais Poderes.

 

Merece destaque o trecho do voto do Min. Salomão no julgamento do EREsp 1886929 e EREsp 1889704 que criou critérios de mitigação do rol que respeitam a ordem regulatória, e a deferência a atividade da ANS, registrando que em nenhum outro país do mundo, há lista aberta de procedimentos e eventos em saúde de cobertura obrigatória pelos planos privados pelo sistema público (...) sendo vedado ao Judiciário, de forma discricionária, substituir a administração no exercício de sua função regulatória.

 

Para além destas questões, o Painel CNJ com dados de novas ações judiciais mostram um verdadeiro salto na curva de demandas judiciais, considerando que em 2022 foram distribuídas 172.190 ações apenas contra Operadoras, e no ano de 2023 foram 233.742, sendo superado no 2024 com 301.383[4], sendo razoável afirmar que a alteração legal provocou um agravamento na judicialização, com a piora da relação entre as operadoras e seus beneficiários, por tornar incerta a extensão das coberturas contratuais, e ainda possibilitando um enorme contingente de fraudes decorrentes de pedidos irregulares, fato este notório no também no noticiário nacional.

 

A publicação representa a opinião de seu emissor, não representando a opinião ou concordância dos clientes do Escritório de Advocacia Bruno Marcelos


[1]MARCELOS, Bruno Teixeira. A regulação em múltiplas arenas e a política regulatória para o rol de procedimentos e eventos em saúde da ANS. Dissertação de Mestrado. FGV -Direito Rio. 2023. https://direitorio.fgv.br/egressos/bruno-teixeira-marcelos 

[3] MOREIRA, Egon Bockman. Regulação sucessiva: quem tem a última palavra? Caso pílula do câncer: ADI 5501 STF. (in) Dinâmica da Regulação. 2ª ed. Forum. 2021

 
 
 

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